quinta-feira, 12 de maio de 2016

Pedido de socorro

(Recomposição de texto anterior)

Haverá choro, ranger de dentes e sorrisos de felicidade - O reino das letras é como o presidente de uma academia literária que preparou uma palestra. Ele falaria, por exemplo, de Lygia Fagundes Telles (19-4-1923), escritora paulistana, em uma reunião da quinta-feira seguinte. Assim, mandou seus assistentes avisarem os demais acadêmicos para a apresentação, mas os convidados não quiseram ir. Com quórum minguado na data da prevista, suspendeu a palestra e mandou outros assistentes dizendo:

“Falem aos acadêmicos que venham na próxima quinta-feira, pois já decorei a fala, ensaiei os gestos, preparei projeção em data show, mandei deixar chávenas para o chá, biscoito Trakinas, e tudo está pronto.” Mas os acadêmicos ao serem contatados não deram a menor atenção; uns foram ao cinema, outros permaneceram a 30 quilômetros em outra cidade, alguns foram jogar truco, um grupo foi cuidar de seus negócios e outros ainda praguejaram contra os assessores e os mataram de vergonha.

Indignado, o presidente foi à porta da academia e gritou para a rua: “Não vai ter golpe”! Em seguida falou a seus assessores: “A palestra da Lygia está mais que pronta, mas os convidados não a mereceram. Portanto vão até as encruzilhadas do caminho e reúnam para o evento todos os que vocês encontrarem, interessados ou não.” Então os auxiliares saíram pelas ruas iluminadas ou escuras, calçadas revitalizadas, boas ou esburacadas e reuniram todos os que encontraram: alunos de escolas do ensino fundamental, escritores ainda desconhecidos, professores amigos de acadêmicos assíduos, e a sala da academia ficou cheia como ainda não havia acontecido este ano. O presidente ao ver a sala cheia disse feliz: “Agora vai ser assim. Quem não cumprir o estatuto ficará sentado à porta da academia no frio da noite impedido de entrar. Ali haverá choro e ranger de dentes”.

Entusiasmado, marcou outro encontro para a quinta-feira seguinte quando viria de quebra um editor famoso para dicas de como publicar um livro. O grupo que veio das ruas foi convidado a  participar novamente, agora sem necessidade sair a caçá-lo. 


Dessa vez, entretanto, só os acadêmicos vieram. O grupo que salvou a reunião na primeira vez evaporou-se. E o presidente ensinou que há pessoas que passam pela  nossa vida para resolver uma crise e, talvez, até para atender a um pedido de socorro. Depois, saem de cena. Só servem para aquele momento. Entender isso é ser feliz.

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