“O homem que não tinha nada acordou bem cedo
Com a luz do sol, já que não tem despertador.
Ele não tinha nada, então também não tinha medo
E foi pra luta como faz um bom trabalhador”
Ele não tinha nada, então também não tinha medo
E foi pra luta como faz um bom trabalhador”
Trata-se, como se percebe numa
primeira apreciação do trabalho, de uma narrativa aberta de montagem
livre e sem formalidades, atributos que se revelam óbvios no gênero, porém, não
fazem com que o todo caia no vulgar. Sabe manter-se linha definida por Andrew Goodwin, em que a ficção e a realidade se complementam, se negam e
se interpretam.
Complementam-se nas cenas em que
letra, imagens e música narram o dia a dia de Josué, um trabalhador comum de
periferia, pai de três filhos sem nenhuma perspectiva de futuro, embora feliz a
seu modo. Cenas de cortes rápidos ilustram o texto cantado enquanto, por seu
lado, a carga emocional da letra, da música, da forte e cadenciada batida
rítmica vai conduzindo ao limite máximo da tensão geral que se busca. Também
reforçam esse caminho as alternâncias das tomadas em cores sujas intercaladas
com as tomadas em preto e branco de maneira bem dosada na filmagem. A sequência é
controlada pelas participações da cantora Negra Li que entra com o refrão nos
momentos certos e caracteriza a proposta do trabalho: ser um protesto contra
a injustiça social do nosso tempo:
“O ser humano é falho, hoje mesmo eu
falhei,
Ninguém nasce sabendo (ninguém), então me deixe tentar”
Ninguém nasce sabendo (ninguém), então me deixe tentar”
O homem que não tinha
nada, tinha Marizete
Maria Flor, Marina, Mari, eu quero ser o menor
Um tinha nove, uma doze, outra dezessete
A de quarenta sempre foi o seu amor maior
Maria Flor, Marina, Mari, eu quero ser o menor
Um tinha nove, uma doze, outra dezessete
A de quarenta sempre foi o seu amor maior
Os demais elementos vão se apresentando
de maneira que fica bem definida a característica videoclipe, embora muitas vezes obedeça ao direcionamento da letra, música e sequência dos cortes.
Sai do comum graças às sequências em cores entremeadas por outras em preto e branco, pelas
ilustrações que às vezes fogem da fidelidade aos versos, com as tomadas visuais
e a alta velocidade das sequências filmadas, da sobreposição de cenas em vários
trechos, material também característico do videoclipe. Mais uma vez, ficção e
realidade se confundem para se completarem, como define Goodwin.
“O Homem que Não Tinha Nada” mostra-se ser um daqueles trabalhos
criados no momento certo, por isto atinge diretamente os sentimentos de quem o
aprecia: transforma-se em brado de revolta nos inconformados, em alento nos
sensíveis e um grito de socorro compreensível por todos. Isto se vê bem se vê
numa sequência de ilustrações de fundo quando Josué é vítima de um atentado. Há
queima de pneus pelos mais exaltados, choro inconformado família, passividade
de quem observa, impunidade a quem pratica e impotência dos vitimados, tudo
mostrado em poucos segundos.
O homem que não tinha
nada, agora já não tinha vida
Deixou pra trás três filhos e sua mulher
O povo queimou pneu, fechou a avenida
E escreveu no asfalto "saudade do Josué"
Deixou pra trás três filhos e sua mulher
O povo queimou pneu, fechou a avenida
E escreveu no asfalto "saudade do Josué"
Saudade, Josué!
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