sábado, 20 de agosto de 2016

Surrealismo? Só se for à brasileira


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Passei por uma cirurgia braba oito anos atrás; coração. Vou muito bem, obrigado, só relembro isto para justificar uma das tantas coisas marcantes que ficaram gravadas na minha memória sobre o período em que permaneci hospitalizado. Uma dessas lembranças é a da “presença do chinês baixinho”, que, diga-se, só ficou mais clara para mim neste sábado, 20 de agosto de 2016, no momento em que eu assistia ao programa “A Arte de Ver”, da TV Cultura.

Enquanto eu voltava à consciência aos poucos, na medida em que passava o efeito da anestesia geral, ainda no centro cirúrgico, eu comecei a observar uma figura curiosa ali entre os médicos e assistentes. Era um enfermeiro chinês (claro que com aquele chapéu tipo abajur virado) baixinho, vestido como os demais daquela sala e a quem todos tratavam muito mal. Chegavam a dar-lhe tapas na cabeça ao mandá-lo fazer as coisas: “pegue o bisturi agora! Sai da minha frente! Limpe essa mancha de sangue!” gritavam, sem poupá-lo fisicamente com empurrões ou qualquer outro gesto agressivo. Fiquei indignado a ponto de, ao ser removido para a UTI, mais ou menos uma hora depois, pedir a um de meus filhos que fosse reclamar à direção do hospital sobre aquele absurdo. Topei comprar uma briga.

Puro delírio. Embora para mim a visão do fato fosse muito nítida, obviamente não acontecera nada daquilo. Virou até piada no hospital durante o período de dois meses de recuperação em que lá permaneci, e não duvido que tenha se tornado case (exemplo) para futuras citações nas palestras de treinamento dos profissionais do hospital.
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Voltando ao “A Arte de Ver”, o programa tratou esta semana de uma escola de pintura do século passado chamada Dadaísmo, que depois gerou o Surrealismo. Assisti-lo mudou minha leitura de mundo, inclusive da situação atual do Brasil e de quebra meu delírio do enfermeiro chinês. 

Mostrou o programa que quando você não controla seu jeito de ser, outros o fazem por você e “em você” o que é muito mais grave. Não entendo porque um programa desse nível só é apresentado em horário absurdo (6 horas “da madrugada” de sábado). Nas chamadas da internet citam apenas o nome “A Arte de Ver” “de passagem”, sem muitos comentários, ficha técnica etc. Penso que é para ninguém desconfiar do “perigo que ele representa às instituições” para quem for capaz de vislumbrar um pouco mais além quando observa um quadro pintado em uma tela. Para piorar, o programa ensina, inclusive, como se faz essa leitura. Por essas razões, eu duvido que repitam a série quando terminar a atual. 

      Revoltado com os horrores da primeira guerra mundial (1914-1918) um grupo de artistas plásticos, escritores e poetas de várias nacionalidades fugiu para Zurique, na Suíça. Eles eram considerados traidores dos países em conflito por causa das críticas que faziam à guerra.  Por obra do acaso, vários deles encontraram-se em certo bar e acabaram por se tornarem amigos. Disto, surgiu a ideia de fundar uma escola de arte que tratasse de coisas que não tivessem qualquer sentido, uma vez que a guerra transformava o mundo em um lugar sem sentido algum, na visão deles. Mundo em que milhares de soldados viviam meses e até mais de ano nas trincheiras que os castigavam com doenças, fome e morte.  Para que? Pra nada. No máximo para conquistar um pedaço de terra menor que a metade do município de Jacareí, por exemplo. “Já que a vida não tem sentido, vamos fazer uma arte sem qualquer sentido, como essa vida”, diziam. E nasceu, assim, o Dadaísmo. Mas, por que razão estamos falando em Dadaísmo, afinal?! Por nada, uai, caso contrário não seria Dadaísmo.

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Brincadeirinha. O Dadaísmo mostra como a mente de pessoas e até de grupo de nações tem os mesmos delírios semelhantes ao que narro no início deste texto ao tentarem encontrar sentido em uma guerra que para homens sensatos nunca passou de pesadelo. Terminado o conflito, o movimento resolveu continuar, mas com uma diferença: Apesar dos mentores utilizarem na arte o mesmo princípio aleatórios do Dadaísmo, passaram a adotar um tema, um objetivo para oque faziam, já que, com o final da  guerra, o mundo voltou à busca de objetivos: nascia, então, o Surrealismo que teve como representante Salvador Dali, dentre outros. 

       O Surrealismo lida com figuras inteligíveis, porém colocadas de maneira desordenada, desarrumada num quadro ou num texto regidas por um tema central. Essas figuras passariam a ser compreensíveis, se por acaso fossem colocadas na devida ordem, dizem os especialistas. É como o Brasil de hoje. Figuras, pessoas, instituições, situações conhecidas foram colocadas em desordem e formaram Petrolão, Mensalão, Passadenão, Merendão, e escândalos que tais. 

Objetivo da bandidagem?! De acordo com o que aos poucos vem sendo comprovado, com o objetivo de consolidar planos de poder de uns e de enriquecimento rápido de outros, para dizer o mínimo. Isso, como já disse, me foi revelado pelo programa “A Arte de Ver”, que vi hoje na TV Cultura, além de outras dicas. Os defensores do Surrealismo explicam que basta arrumar a desarrumação que tudo volta ao seu lugar e passa a ser mais compreensível de novo (Não conte aos  senadores!). Acho que não desejamos isto para o país, a menos que seja um Surrealismo à brasileira: a arrumação sim, mas a “volta”, Deus nos livre.

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